Hoje eu preciso de um desabafo.
Como tantas coisas contra as quais não posso lutar, eu tento agora lutar contra a minha vontade de assumir isso como um momento normal e pelo qual todos passam e deixar-me simplesmente aceitar que talvez vá haver momentos piores que este em minha vida... e irão.
Como começar eu não mais sei. Começa-se pelo começo, mas eu já nem sei mais quando foi isso.
Eu acho que é meu último recurso, pois já esgotaram-se todas as possíveis maneiras de fazer essa situação mudar. O meu medo é ter que apagar muitas mais palavras do que enfim escrevê-las,e assumo que é realmente difícil me empreender nisso de vez.
O que eu posso falar?
Eu não posso mais gritar. Eu não tenho mais forças para reverter toda a situação que eu resolvi assumir como sendo minha culpa.
Morte, desgaste, decepção, abandono. Alguns destes já passaram por mim, outros deram suas ameaças de agouro breve. Mas qual a diferença que faz com que estes passem por mim e deixem somente sua essência no ar, como sentir o cheiro breve e marcante de asfalto molhado antes da tormenta?
Acho que é a culpa; por mais que eu tente, eu tenho tanto medo de confrontar e falar a verdade, deixar que finalmente minha máscara de falsa paz caia aos pés e se dissolva com a água que jorra dos bueiros entupidos de emoções decompostas.
Sem a culpa, nos deparamos um dia depois do tempo despercebido e contemplamos todas a vida que nasceu da chuva, tudo - que antes tinha a rudeza e o choque do suspiro primordial de vida - hoje cresce fértil e aguarda com condescendência resignada o momento de morrer, não com os braços cruzados. Não... com os braços bem abertos em direção á luz da eternização pela memória.
Eu tentei erguer esse momento aos céus como uma oferenda, em desespero, esperando que aceitassem a minha súplica por uma paz que não sei se mereço.
Se eu ao menos temer a idéia de estar me transformando num agouro da minha própria sombra e essência... será isto suficiente para que aja um sinal de condescendência à minha situação?
Eu estou tentando falar a você. Você que sabe quem é, que fez todas essas coisas comigo, que aceitou tudo que não podia ter aceitado, que me traiu e me abandonou. Você que passou tanto tempo comigo que me fez depender impessoalmente dessa tua confiança em mim. Você que ouviu tantas das minhas palavras e me julgou tola, mas que não se assustou como eu quando percebeu que aquelas palavras eram só um disfarce de tristeza, que o verdadeiro momento de dor é agora. Você, que passou tanto tempo comigo, que chorou tanto comigo, que sorriu tanto comigo, que agora eu não sei mais quem é quem. Você sou eu. E eu só queria ter você de volta.
Texto de Renata S. Corrêa